Por Isabel Baptista, diretora pedagógica do Colégio Fênix Santa Paula.
O QUE É SER ÍNDIO
Os
habitantes das Américas foram chamados de índios pelos europeus que aqui
chegaram. Uma denominação genérica, provocada pela primeira impressão que eles
tiveram de haverem chegado às Índias.
Mesmo
depois de descobrir que não estavam na Ásia, e sim em um continente até então
desconhecido, os europeus continuaram a chamá-los assim, ignorando
propositalmente as diferenças linguístico-culturais. Era mais fácil tornar os
nativos todos iguais, tratá-los de forma homogênea, já que o objetivo era um
só: o domínio político, econômico e religioso.
Durante
o Período Colonial era assim, ao longo dos tempos, definir quem era índio ou
não constituía sempre uma questão legal. Desde a independência em relação às
metrópoles européias, vários países americanos estabeleceram diferentes
legislações em relação aos índios e foram criadas instituições oficiais para
cuidar dos assuntos a eles relacionados.
Nas
últimas décadas, o critério da auto-identificação étnica vem sendo o mais
amplamente aceito pelos estudiosos da temática indígena. Na década de 50, o
antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro baseou-se na definição elaborada pelos
participantes do II Congresso Indigenista Interamericano, no Peru, em 1949,
para assim definir, no texto "Culturas e línguas indígenas do
Brasil", o indígena como: "(...) aquela parcela da população brasileira
que apresenta problemas de inadaptação à sociedade brasileira, motivados pela
conservação de costumes, hábitos ou meras lealdades que a vinculam a uma
tradição pré-colombiana. Ou, ainda mais amplamente: índio é todo o indivíduo
reconhecido como membro por uma comunidade pré-colombiana que se identifica
etnicamente diversa da nacional e é considerada indígena pela população
brasileira com quem está em contato".
Uma definição muito semelhante foi adotada pelo Estatuto do Índio (Lei nº. 6.001, de 19.12.1973), que norteou as relações do Estado brasileiro com as populações indígenas até a promulgação da Constituição de 1988. Em suma, um grupo de pessoas pode ser considerado indígena ou não se estas pessoas se considerarem indígenas, ou se assim forem consideradas pela população que as cerca.
Mesmo
sendo o critério mais utilizado, ele tem sido colocado em discussão, já que
muitas vezes são interesses de ordem política que levam à adoção de tal
definição, da mesma forma que acontecia há 500 anos.
IDENTIDADE E DIVERSIDADE
As populações
indígenas são vistas pela sociedade brasileira ora de forma preconceituosa, ora
de forma idealizada. O preconceito parte, muito mais, daqueles que convivem
diretamente com os índios: as populações rurais.
Dominadas política, ideológica e economicamente por elites municipais com fortes interesses nas terras dos índios e em seus recursos ambientais, tais como madeira e minérios, muitas vezes as populações rurais necessitam disputar as escassas oportunidades de sobrevivência em sua região com membros de sociedades indígenas que aí vivem.
Dominadas política, ideológica e economicamente por elites municipais com fortes interesses nas terras dos índios e em seus recursos ambientais, tais como madeira e minérios, muitas vezes as populações rurais necessitam disputar as escassas oportunidades de sobrevivência em sua região com membros de sociedades indígenas que aí vivem.
Por isso, utilizam estereótipos, chamando-os de "ladrões", "traiçoeiros", "preguiçosos" e "beberrões", enfim, de tudo que possa desqualificá-los. Procuram justificar, desta forma, todo tipo de ação contra os índios e a invasão de seus territórios. Já a população urbana, que vive distanciada das áreas indígenas, tende a ter deles uma imagem favorável, embora os veja como algo muito remoto.
Os índios são considerados a partir de um conjunto de imagens e crenças amplamente disseminadas pelo senso comum: eles são os donos da terra e seus primeiros habitantes, aqueles que sabem conviver com a natureza sem depredá-la. São também vistos como parte do passado e, portanto, como estando em processo de desaparecimento, muito embora, como provam os dados, nas três últimas décadas tenha se constatado o crescimento da população indígena.
Só recentemente os diferentes segmentos da sociedade brasileira estão se conscientizando de que os índios são seus contemporâneos. Eles vivem no mesmo país, participam da elaboração de leis, elegem candidatos e compartilham problemas semelhantes, como as conseqüências da poluição ambiental e das diretrizes e ações do governo nas áreas da política, economia, saúde, educação e administração pública em geral.
Hoje, há
um movimento de busca de informações atualizadas e confiáveis sobre os índios,
um interesse em saber, afinal, quem são eles.
Qualquer grupo social humano elabora e constitui um universo completo de conhecimentos integrados, com fortes ligações com o meio em que vive e se desenvolve.
Qualquer grupo social humano elabora e constitui um universo completo de conhecimentos integrados, com fortes ligações com o meio em que vive e se desenvolve.
Entendendo
cultura como o conjunto de respostas que uma determinada sociedade humana dá às
experiências por ela vividas e aos desafios que encontra ao longo do tempo,
percebe-se o quanto as diferentes culturas são dinâmicas e estão em contínuo
processo de transformação.
O Brasil possui uma imensa diversidade étnica
e linguística, estando entre as maiores do mundo.São 215 sociedades indígenas,
mais cerca de 55 grupos de índios isolados, sobre os quais ainda não há informações
objetivas.
180 línguas, pelo menos, são faladas pelos membros destas sociedades, as quais pertencem a mais de 30 famílias lingüísticas diferentes.
180 línguas, pelo menos, são faladas pelos membros destas sociedades, as quais pertencem a mais de 30 famílias lingüísticas diferentes.
No
entanto, é importante frisar que as variadas culturas das sociedades indígenas
modificam-se constantemente e reelaboram-se com o passar do tempo, como a
cultura de qualquer outra sociedade humana. E é preciso considerar que isto
aconteceria mesmo que não houvesse ocorrido o contato com as sociedades de
origem européia e africana.
No que
diz respeito à identidade étnica, as mudanças ocorridas em várias sociedades
indígenas, como o fato de falarem português, vestirem roupas iguais às dos
outros membros da sociedade nacional com que estão em contato, utilizarem
modernas tecnologias (como câmeras de vídeo, máquinas fotográficas e aparelhos
de fax), não fazem com que percam sua identidade étnica e deixem de ser
indígenas.
A diversidade cultural pode ser enfocada tanto sob o ponto de vista das diferenças existentes entre as sociedades indígenas e as não-indígenas, quanto sob o ponto de vista das diferenças entre as muitas sociedades indígenas que vivem no Brasil. Mas está sempre relacionada ao contato entre realidades socioculturais diferentes e à necessidade de convívio entre elas, especialmente num país pluriétnico, como é o caso do Brasil.
É necessário reconhecer e valorizar a identidade étnica específica de cada uma das sociedades indígenas em particular, compreender suas línguas e suas formas tradicionais de organização social, de ocupação da terra e de uso dos recursos naturais.
Isto significa o respeito pelos direitos coletivos especiais de cada uma delas e a busca do convívio pacífico, por meio de um intercâmbio cultural, com as diferentes etnias.
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